Conforme comentei em um post anterior quero falar um pouco sobre o Santana, figura lendária da cidade de Pedro Osório,lavador de carros,ex- vereador em P.Osório , Santana é um marginal por opção, conhecido de Norte a Sul do Brasil, nos altos de seus 50 e poucos anos , em sua pacata cidade já passaram grandes nomes do violão brasileiro, cantadores e violeiros importantes da cultura popular brasileira .
Tudo começou quando o Gabeira , uma das figuras da fauna Pedrosoriense ao ouvir o disco "Na Quadrada das Águas Perdidas" de Elomar Figueira de Mello , compositor baiano de árias sertânicas e que tem um trabalho a altura de um Villa Lobos em importância para a cultura brasileira ,Gabeira foi compartilhar tal audição com alguns amigos entre eles o Santana que se encantou com a música de Elomar ,Gabeira arrumou suas malas e se mandou pra Caatinga baiana pra saber quem fazia aquela música tão estranha aos seus ouvidos,tão recheada de uma brasilidade latente e que ninguém conhecia.
Chegando em solo baiano, mais precisamente em Vitória da Conquista, rumou pro sertão pra achar o caatingueiro, que vive isolado em seu sertão compondo , cuidando de carneiros e pastorando estrelas, resumindo essa passagem, Gabeira ficou um mês aproximadamente hospedado na casa de Elomar, lá conheceu Xangai, Dercio Marques e outros malungos que estavam gravando outro disco de Elomar em plena caatinga, a obra "Auto da Caatingueira" , Gabeira acabou participando do coral do disco , ficou amigo de Elomar e manifestou a vontade de que Elomar fosse a Pedro Osorio, o que aconteceu em seguida e inaugurou uma série de cantorias em terras gaúchas onde vieram muitos nomes de várias partes do Brasil a partir da primeira vinda de Elomar a Pedro Osorio , muitos apaixonaram-se pela cidade e pelo amigo de alma maneira Santana que move seus contatos na cidade ,organiza as cantorias com pouca estrutura de forma simples, oferece depois um peixe assado ou um churrasco pros amigos que se movem de Pelotas, Porto Alegre, São Lourenço, Rio Grande, Jaguarão para assistir esses espetáculos singulares que muitas vezes não passam pela capital nem por Pelotas.
Santana é um apaixonado por violão, conhecedor extremo da cultura em torno desse instrumento,compositores, gravações,ele é referência para muitos violonistas do Brasil afora que já passaram por lá como JoãoPedro Borges, Turibio Santos, Daniel Wolff, Eduardo Castanera e muitos outros , o próprio Turibio Santos ,violonista e diretor do Museu Villalobos escreveu sua (quase) autobiografia com o titulo "Mentiras ou não?" sendo o capitulo com esse titulo dedicado a Pedro Osorio, onde ele cita que as três cidades mais importantes que ele tocou em sua vida são Paris, Rio de Janeiro e Pedro Osório, nesse capítulo ele narra sua passagem por Pedro Osorio onde descreve o quese vê por lá em dia de cantoria ou recital de violões, uma verdadeira paisagem dos filmes do Fellini ,pois quando Turibio esteve por lá, foi um momento onde a cidade era conhecida como "paradouro dos Deuses" habitada por místicos e malucos de toda espécie. Em entrevista ao programa "Conexão Roberto Dávila" , Turibio Santos cita essa passagem em Pedro Osorio aos olhares estupefatos do entrevistador.
A jornalista e escritora Ana Maria Bahiana entrevistou certa feita o Santana para a Veja relatando seus feitos e forma de ver a vida despojada com um olhar carinhoso sobre as coisas , desapegado que amarrou seu velho chalé em uma árvore , chalé abarrotado de discos de vinil de jazz que iniciaram muita gente que trilha os caminhos musicais, cds, fitas vhs que segundo ele são infinitamente melhores que os dvds , mas tb alguns dvds de música que ele compra em porções generosas e espalha aos amigos .
Santana é uma daquelas pessoas que quem conhece não esquece, seja pelo impacto que sua aparência desperta em nosso ínitmo, como se fizesse uma leitura de nossa alma ao conhecê-lo , de chinelos de dedo, calças rasgadas , cabelos desgrenhados, uma camisa rota ,magro e sempre fumando seus cigarros enrolados e com um olhar muito doce, Santana revela os preconceitos escondidos dentro de cada um de nós, como certa feita eum um show de Hermeto Pascoal em Pelotas no Theatro Sete de Abril , Santana tinha comprado dois ingressos sendo um para ele e outro para um amigo que viria ao show, o amigo não apareceu e Santana foi até a fila oferecer o ingresso de graça para um cidadão , ele ao se deparar com Santana e sua forma desgrenhada de ser, moveu todos preconceitos que habitavam sua alma e disse:
"Não tenho dinheiro pra lhe dar ", eu ao lado do Santana presenciei aquilo atônito e ele disparou com seu espírito sempre crítico e jeito peculiar :
"-Deixa de ser babaca , cara, eu ia te dar o ingresso", o cidadão perdeu a linha pois ao ver que várias pessoas chegavam na frente do teatro e cumprimentavam calorosamente Santana , sentiu que tinha cometido algum erro grave e comprou uma cerveja pra amenizar seu erro e ofereceu a Santana, ele ainda indignado olhou pro cara e disse "-Eu não bebo cara só fumo maconha".
Essa é uma das passagens que vivi ao lado dessa figura lendária chamada Santana, e sempre que vejo alguns figurões inoperantes da cultura local com seus ternos bem cortados e sorrisos largos em colunas sociais , sinto pena deles e sempre lembro da figura que a vida me deu o prazer de conhecer que é o Santana , lembro também desse cidadão que teve essa atitude com o Santana em frente ao teatro e imagino que ele deve ter repensado muito a vaidade que nutria seus preconceitos.
Já passaram por Pedro Osório ,além dos já citados: Elomar e Camerata Caleidoscópio , Xangai , Pereira da Viola, Cia de Flamenco Andrea del Puerto,Batuque de Cordas , Demétrio Xavier, Victor Batista , entre muitos outros.
A foto que está acima dessa postagem é Gabeira , Elomar, Santana e Pedro Caldas em Pedro Osório e a foto ao lado é o Santana com Vinicius Corrêa do duo Batuque de Cordas, posso passar dias falando do Santana mas não conseguria descrever essa figura por completo, então essa humilde postagem da um pequeno panorama do amigo que sempre serviu de inspiração pra mim em muitas instâncias da vida
Dia 24/10 Pedro Osorio recebe a cantadora Kátya Teixeira em mais uma cantoria histórica.
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